quarta-feira, 12 de junho de 2013

As cartas que nunca te entreguei



(excerto) 

Sónia M. 

Batias insistentemente a uma porta que eu nunca abria.
Chegavas sempre nos dias mais quentes, como um pássaro,
deixando na entrada as flores, que colhias nos campos por onde passavas.
Nunca te senti longe, nem perto, fora, ou dentro. Apenas sentia que estavas.
Pertencias ao que comigo nascera, como uma mão, um olho, um braço, ou um dedo, 
talvez metade de tudo o que o peito alberga. Eras assim uma parte minha, 
que encontrei num daqueles acasos em que eu nem acredito.
Foi no dia em que te esperei, com a porta aberta, que não chegaste.
Decifrei assim o meu primeiro enigma. O mistério do tempo das coisas. 
Porque mesmo o que é nosso, deve ser agarrado no tempo certo em que se percebe, 
se descobre, que sempre o foi.
(...)

Sónia M. 

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