Cecília Meireles
"A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.
Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.
Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.
Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.
Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.
Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.
Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.
Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.
Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera."
Cecília Meireles
sábado, 31 de outubro de 2009
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
QUEM SOU EU?
João Almeida Santos
Quem sou eu seu moço?
Um aposentado!
despejado por aqui ha muitos anos atrás,
quando o frio cortava feito navalha
e eu vestido numa camisa"volta ao mundo",
e um monte de sonhos perdidos...
Quem sou eu seu moço?
Um aposentado....
Mas fui um equilibrista nos andaimes da vida,
pelejei, amei e quando já sabia ser filho
fui pai....fui pai...
Pai jovem, pai meia idade
E agora pai meio envelhecido...
E ainda querendo ser poeta!
Não quero a Academia Brasileira de Letras,
mas eu tenho meu tamborete no varandado da minha casa,
onde os sonhos que se apagam
me permitem versar sem rima,
a pergunta:
por que?
Quem sou eu seu moço?
Um aposentado!
despejado por aqui ha muitos anos atrás,
quando o frio cortava feito navalha
e eu vestido numa camisa"volta ao mundo",
e um monte de sonhos perdidos...
Quem sou eu seu moço?
Um aposentado....
Mas fui um equilibrista nos andaimes da vida,
pelejei, amei e quando já sabia ser filho
fui pai....fui pai...
Pai jovem, pai meia idade
E agora pai meio envelhecido...
E ainda querendo ser poeta!
Não quero a Academia Brasileira de Letras,
mas eu tenho meu tamborete no varandado da minha casa,
onde os sonhos que se apagam
me permitem versar sem rima,
a pergunta:
por que?
terça-feira, 13 de outubro de 2009
Chove chuva
O compadre Jorge Benjor já cantava e pedia: chove sem parar. Só assim pra escutar o mato crescer em paz
Depois de um longo período de estiagem e como diz a sabedoria do homem da roça, dos meses sem érres, e muitos outros, a chuva veio. Veio amenizar a secura do ar irrespirável e o calor das tardes/noites de paredes mornas nos quartos da casa. Chegou de mansinho a chuva, como convém; com a esperança de todos para que se tarde a ir. Que permaneça o tempo suficiente para molhar a terra e permitir o plantio das culturas do tempo das águas.
Veio abastecer a mina d´água, escondida na mata da grota, para engrossar o jorro que esvai por um cano de bambu improvisado.
E, noite adentro, os pingos sucediam um ao outro pelas calhas, resvalando ao chão, depois, pelos cantinhos e procurando os veios das entranhas da terra.
E, quando o dia chegou, para lá da janela do quarto e do muro do quintal, lá no mato os passarinhos avisam que também vieram. O sanhaço e a saíra se assanham, a tesoura revoluteia no ar à caça de insetos, o tiziu dá pios e saltos nos mourões, a coleirinha e o bigodinho lançam seus primeiros trinados.
E o papa-capim anuncia sua volta, depois de uma longa viagem, avisando que é hora de acasalar e aninhar, recriando a vida naquele coraçãozinho minúsculo e apressado. Um broto novo e tímido aponta no galho alto da árvore centenária.E o matuto respira aliviado, reza e agradece. Choveu, enfim...
Depois de um longo período de estiagem e como diz a sabedoria do homem da roça, dos meses sem érres, e muitos outros, a chuva veio. Veio amenizar a secura do ar irrespirável e o calor das tardes/noites de paredes mornas nos quartos da casa. Chegou de mansinho a chuva, como convém; com a esperança de todos para que se tarde a ir. Que permaneça o tempo suficiente para molhar a terra e permitir o plantio das culturas do tempo das águas.
Veio abastecer a mina d´água, escondida na mata da grota, para engrossar o jorro que esvai por um cano de bambu improvisado.
E, noite adentro, os pingos sucediam um ao outro pelas calhas, resvalando ao chão, depois, pelos cantinhos e procurando os veios das entranhas da terra.
E, quando o dia chegou, para lá da janela do quarto e do muro do quintal, lá no mato os passarinhos avisam que também vieram. O sanhaço e a saíra se assanham, a tesoura revoluteia no ar à caça de insetos, o tiziu dá pios e saltos nos mourões, a coleirinha e o bigodinho lançam seus primeiros trinados.
E o papa-capim anuncia sua volta, depois de uma longa viagem, avisando que é hora de acasalar e aninhar, recriando a vida naquele coraçãozinho minúsculo e apressado. Um broto novo e tímido aponta no galho alto da árvore centenária.E o matuto respira aliviado, reza e agradece. Choveu, enfim...
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Desabafo
14/08/2009
Dr. Sócrates ex jogador de futebol
A alma doída não cicatriza mesmo quando estamos acostumados com a insensatez dos que possuem os meios para nos esmagar com suas palavras amargas decorrentes sei lá do quê.
Choramos lágrimas surgidas bem lá de dentro do nosso ser, subindo as paredes da emoção com uma determinação que gravidade nenhuma jamais seria capaz de detê-las. E, lá no alto, irrompem como
a lava dos mais ativos vulcões. Em seguida, deixam-se levar pela face, como as límpidas águas de cachoeiras, como mantos divinos a cair sem queixas pelos ares inertes da natureza assassinada pela incoerência humana.
Infelizmente delas não conhecemos mais que isso, pois nunca poderemos estar sob a sua proteção, livres das agruras oferecidas desbragadamente pelos espíritos mais sórdidos.
O arrepio a desgrenhar os nossos, por todo o corpo, dobra-os como folhas secas de outono sem, no entanto, derrubá-los e finalmente livrá-los do destrato com que são vistos pelos caules fraudulentos que os acolheram durante a primavera mais florida.
Ficar sem razão mais dor nos causa, e o sentir sem culpa nos desespera perante o coração sangrante sentido aqui dentro, como uma hemorragia sem fim e sem paz. Cala nossa voz sem que dela possamos extrair a reação de que necessitamos.
Enforca nosso olhar, deixando-o sem luz e sem cor, muito menos com a profundidade da reflexão tornada fundamental para buscar o entendimento e o conhecimento da origem da lança certeira, a nos flagelar e congelar sem piedade.
Tudo se turva e se dobra à nossa frente. Nossos entes queridos sofrem em silêncio brutal, sem poder nos socorrer, já que as armas dessa guerra jamais lhes foram apresentadas.
É uma guerra sem vencedores desde sempre. Mesmo assim temos de fazer parte dela e escapar com vida, ainda que feridos na essência de nossa frágil existência. A face contrita dos que nos cercam nos endurece, faz padecer. Um sentimento de impotência nos toma por inteiro, imobilizando-nos na fraqueza expressa na impotência do grito a explodir na garganta, do gesto que nos apequena em uma gaiola sem portas e sem alpiste.
Contudo, somos poucos, ainda que muito engajados para esmorecer por tão pouco. Muito pouco parte daí e aí voltará, pois não há quem possa imaginar que alguns sentimentos menores possam enfrentar gigantes que se oferecem em sacrifício pela busca do que há de melhor no ser humano e no humanismo com o claro desejo de dias e homens melhores. Para que essa melhoria se expanda a cada gene que há de nascer, até que o nosso universo desapareça por completo.
Muito diferente desses seres que não conseguem enxergar que são finitos na infinita incapacidade de sentir compaixão pelo outro, como se esta fosse uma nojenta e insana forma de se sentirem seres sociais e sociáveis.
Não somos tiranos, muito menos estamos arraigados em alguma seita que explora os desavisados e ignorantes que nada têm. E o que têm enviam aos seres que deles só querem a vida como se dela utilizassem para sua pretensa imortalidade capitalista e mercantilista.
Não somos também ingênuos a ponto de esperar pelo possível em apenas uma encarnação ou geração, e sim um grupo de loucos por justiça, carinhos e solidariedade. Sonhamos com um mundo que se não for o ideal que dele se aproxime ou, pelo menos, que todos queiram construir com zelo e cuidado para que nada se desvie e desvirtue.
Não somos perfeitos porque a perfeição não faz parte de nossas possibilidades terrenas, muito menos imaginamos assistir a uma comunhão coletiva de ideias semelhantes para se formar uma procissão de fiéis defensores do caminho em que acreditamos.
Queremos apenas deixar uma dúvida, uma sintética posição de que é possível sonhar com o impossível de hoje para encontrar amanhãs mais ensolarados e aquecidos que esquentem e iluminem determinada facção da humanidade.
Um sonho apenas que, de tanto ser mais do que nossa limitada capacidade possa entender, incomoda, incomoda e incomoda a tantos que dele nada sabem, ou melhor, nada querem saber. Só sabem que o que queremos é bom e o bom não é tão bom para eles.
Quando um de nós é agredido, algo insanamente frequente, nos tornamos mais guerreiros e acreditamos ainda mais no que estamos fazendo, pensando e pulverizando pelos ventos que por nós passam desavisados de nossa intenção.
Chegamos até aqui devido à coerência. Que a voz e a cultura popular continuem a nos proteger desta peste vil.
Dr. Sócrates ex jogador de futebol
A alma doída não cicatriza mesmo quando estamos acostumados com a insensatez dos que possuem os meios para nos esmagar com suas palavras amargas decorrentes sei lá do quê.
Choramos lágrimas surgidas bem lá de dentro do nosso ser, subindo as paredes da emoção com uma determinação que gravidade nenhuma jamais seria capaz de detê-las. E, lá no alto, irrompem como
a lava dos mais ativos vulcões. Em seguida, deixam-se levar pela face, como as límpidas águas de cachoeiras, como mantos divinos a cair sem queixas pelos ares inertes da natureza assassinada pela incoerência humana.
Infelizmente delas não conhecemos mais que isso, pois nunca poderemos estar sob a sua proteção, livres das agruras oferecidas desbragadamente pelos espíritos mais sórdidos.
O arrepio a desgrenhar os nossos, por todo o corpo, dobra-os como folhas secas de outono sem, no entanto, derrubá-los e finalmente livrá-los do destrato com que são vistos pelos caules fraudulentos que os acolheram durante a primavera mais florida.
Ficar sem razão mais dor nos causa, e o sentir sem culpa nos desespera perante o coração sangrante sentido aqui dentro, como uma hemorragia sem fim e sem paz. Cala nossa voz sem que dela possamos extrair a reação de que necessitamos.
Enforca nosso olhar, deixando-o sem luz e sem cor, muito menos com a profundidade da reflexão tornada fundamental para buscar o entendimento e o conhecimento da origem da lança certeira, a nos flagelar e congelar sem piedade.
Tudo se turva e se dobra à nossa frente. Nossos entes queridos sofrem em silêncio brutal, sem poder nos socorrer, já que as armas dessa guerra jamais lhes foram apresentadas.
É uma guerra sem vencedores desde sempre. Mesmo assim temos de fazer parte dela e escapar com vida, ainda que feridos na essência de nossa frágil existência. A face contrita dos que nos cercam nos endurece, faz padecer. Um sentimento de impotência nos toma por inteiro, imobilizando-nos na fraqueza expressa na impotência do grito a explodir na garganta, do gesto que nos apequena em uma gaiola sem portas e sem alpiste.
Contudo, somos poucos, ainda que muito engajados para esmorecer por tão pouco. Muito pouco parte daí e aí voltará, pois não há quem possa imaginar que alguns sentimentos menores possam enfrentar gigantes que se oferecem em sacrifício pela busca do que há de melhor no ser humano e no humanismo com o claro desejo de dias e homens melhores. Para que essa melhoria se expanda a cada gene que há de nascer, até que o nosso universo desapareça por completo.
Muito diferente desses seres que não conseguem enxergar que são finitos na infinita incapacidade de sentir compaixão pelo outro, como se esta fosse uma nojenta e insana forma de se sentirem seres sociais e sociáveis.
Não somos tiranos, muito menos estamos arraigados em alguma seita que explora os desavisados e ignorantes que nada têm. E o que têm enviam aos seres que deles só querem a vida como se dela utilizassem para sua pretensa imortalidade capitalista e mercantilista.
Não somos também ingênuos a ponto de esperar pelo possível em apenas uma encarnação ou geração, e sim um grupo de loucos por justiça, carinhos e solidariedade. Sonhamos com um mundo que se não for o ideal que dele se aproxime ou, pelo menos, que todos queiram construir com zelo e cuidado para que nada se desvie e desvirtue.
Não somos perfeitos porque a perfeição não faz parte de nossas possibilidades terrenas, muito menos imaginamos assistir a uma comunhão coletiva de ideias semelhantes para se formar uma procissão de fiéis defensores do caminho em que acreditamos.
Queremos apenas deixar uma dúvida, uma sintética posição de que é possível sonhar com o impossível de hoje para encontrar amanhãs mais ensolarados e aquecidos que esquentem e iluminem determinada facção da humanidade.
Um sonho apenas que, de tanto ser mais do que nossa limitada capacidade possa entender, incomoda, incomoda e incomoda a tantos que dele nada sabem, ou melhor, nada querem saber. Só sabem que o que queremos é bom e o bom não é tão bom para eles.
Quando um de nós é agredido, algo insanamente frequente, nos tornamos mais guerreiros e acreditamos ainda mais no que estamos fazendo, pensando e pulverizando pelos ventos que por nós passam desavisados de nossa intenção.
Chegamos até aqui devido à coerência. Que a voz e a cultura popular continuem a nos proteger desta peste vil.
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
Os gatos da rua de baixo.
João Almeida
(inspirado num personagem de um livro de bolso)
Os gatos da rua de baixo
não se aquietam,
e já e noite muito tarde....
Estão na brincadeira,
ou numa disputa por uma gata...
Ou brigam na perseguição à um rato,
ou simplesmente brincam.
Os gatos da rua de baixo
me incomodam...
Ou sei lá...
a minha insônia
é que dá importância
aos gatos
ou a minha solidão.
Sem os gatos da rua de baixo
com todo silencio
desta noite fria
eu não conseguiria dormir
e pior
não consigo fugir,
enquanto o morador do jardim
que não é jardineiro
vagueia dia a fio,
e quando é madrugada
adormece sobre um banco
sem ligar para os miados dos gatos.
É , severa conclusão,
perto de um novo amanhecer...
Nem pílulas, nem sucos, nem chás...
Eu só precisava pra dormir
Era ter você aqui.
(inspirado num personagem de um livro de bolso)
Os gatos da rua de baixo
não se aquietam,
e já e noite muito tarde....
Estão na brincadeira,
ou numa disputa por uma gata...
Ou brigam na perseguição à um rato,
ou simplesmente brincam.
Os gatos da rua de baixo
me incomodam...
Ou sei lá...
a minha insônia
é que dá importância
aos gatos
ou a minha solidão.
Sem os gatos da rua de baixo
com todo silencio
desta noite fria
eu não conseguiria dormir
e pior
não consigo fugir,
enquanto o morador do jardim
que não é jardineiro
vagueia dia a fio,
e quando é madrugada
adormece sobre um banco
sem ligar para os miados dos gatos.
É , severa conclusão,
perto de um novo amanhecer...
Nem pílulas, nem sucos, nem chás...
Eu só precisava pra dormir
Era ter você aqui.
sexta-feira, 11 de setembro de 2009
PÉTALAS
ALCEU VALENÇA
As borboletas voam sobre o meu jardim
São cores vivas, pousam sobre as "onze horas"
Nas rosas claras, violetas e jasmins
Um beija-flor traindo a rosa amarela
Beijou a bela margarida infiel
Papoula e dália estão cravadas de ciúmes
E o beija-flor beijando flores a granel
Pétalas, asas amarelas
Pétalas, espinho seco
Folha, flor, lagarta
Pétalas
As flores voam e voltam na outra estação
Só serei flor quando tu flores no verão
As borboletas voam sobre o meu jardim
São cores vivas, pousam sobre as "onze horas"
Nas rosas claras, violetas e jasmins
Um beija-flor traindo a rosa amarela
Beijou a bela margarida infiel
Papoula e dália estão cravadas de ciúmes
E o beija-flor beijando flores a granel
Pétalas, asas amarelas
Pétalas, espinho seco
Folha, flor, lagarta
Pétalas
As flores voam e voltam na outra estação
Só serei flor quando tu flores no verão
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
Fragmentos de: Os Heróis da Minha Infância
Joilson Kariry Rodrigues
O sertão é povoado de heróis.
Em meus tempos de menino vi a fulô do mandacaru fulorar na seca,
vi o avoar do carcará que é bicho danado, rei dos céus.
Dona Das dores pegou pra mais de duzentos meninos na porta do nascimento,
O carcará é rei dos céus do sertão e pega menino pequeno que se aventura nos monturos.
Xô, bicho malvado, xô. Tem que botar sarro de cachimbo no umbigo que é pra sarar logo,
mas também pra espantar o bicho do céu, ave de rapina.
Cresci assim, respeitando essas coisas de sabedoria infinita, vendo surgir meus heróis do sertão.
O sertão pariu Virgulino e Cego Aderaldo, Patativa e Vitalino, Gonzagão e Normando, Abidoral e Dihelson.
Padim Ciço ta lá, de olho espichado vendo tudo, dando proteção ao sertanejo e inspiração a nossos ídolos.
Assim cresci naquele solo poderoso, vivi minha adolescência e meus heróis.
Uma Patativa cantava lá pros lados do Assaré, a Asa Branca de Exu voava nos céus do Brasil.
Tio Chico Recanto, o profeta, dizia coisas ruins daqueles anos, ele via no sereno da madrugada.
Eu ia às novenas sem interesse nas rezas, trajando minha única camisa azul de volta-ao-mundo,
E aquele espetáculo de vozes à capela, nas noites de novenas, ainda enchem os ouvidos das minhas lembranças.
Ali eu assisti meus primeiros concertos musicais. Depois do show voltava para casa,
Os dias brancos iam e vinham, quentes, bafejando mormaço, dando relâmpagos lá no canto do poente, enganando o sertanejo com promessas inúteis.
Eu era um menino do sertão, bicho manso embrutecendo nas capoeiras, com a alma inundada de cantiga de novena, achando que o sertão era do tamanho do mundo, grande e rachado, e todas as águas estavam represadas num tal açude de Óros, que nas conversas de meninos era maior que todos os oceanos juntos.
A poeira dos caminhos, que só davam pro Crato, redemoinhava no vento da boca da noite, levando o Cão no miolo da carrapeta de vento, forçando a gente a fazer o sinal da cruz.
E foi num giro de vento desses que chegaram os cantadores repentistas, meus primeiros heróis.
Contaram histórias em rimas ligeiras, desafios improvisados, causos de príncipes valentes de reinos mais longe que o Juazeiro.
Depois foram embora num vento que deu de madrugada. E veio o circo São Jorge. O maior circo do mundo, gritava o palhaço se equilibrando em pernas de paus.
Pra nósos meninos do sertão, O PALHAÇO NA PERNA DE PAU ERA UM DO NOSSOS HEROI
Seguíamos o nosso novo herói rua afora, fazendo festa, protegendo a marca de carimbo decalcada no dorso da mão, que nos dava direito à entrada grátis.
E o circo foi embora prometendo voltar, jamais voltou. Então inventávamos outras vadiagens para esquecer a espera inútil.
O sertão era imenso, a maior de todas as terras. E vinha na poeira dos caminhos os homens de gibão. Tangiam boiadas magras, bebiam cachaça e davam aboios tristes que me faziam querer chorar.
Não sei se eram homens, se eram lendas, só sei que amei aqueles seres bárbaros.
A lua mora no sertão e pouco sai de lá para visitar outras terras. Acho mesmo que foi o sertão quem pariu a lua, ou o inverso, porque lá ela se acende como uma coivara em chamas no céu.
E se dá aos bichos da caatinga, aos amantes, alumia os caminhos por onde andou Lampião e seu bando de justiceiros. Alumia as calçadas, as ruas, os alpendres, invade as casas na hora de dormir, pelos buracos das paredes de taipas. A lua é intrusa, mãe do sertão, ou filha, parceira do Caipora. E um dia eu descobri que a lua do sertão é o melhor presente que se dá a uma namorada.
E era sob o olhar majestoso da lua que eu ouvia as histórias dos cangaceiros, homens destemidos, mulheres valentes. E no dia seguinte dávamos vida a esses nossos heróis, em nossas brincadeiras de cangaço e volante.
Se aprendia a soletrar o be a ba no cordel, nossa cartilha encantada. Aí o sertão era pequeno pra tanta história bonita.
O sertão ardia feito brasa de angico em fogueira de São João. Não dava chuva, só relâmpagos inúteis no canto do poente.
A asa branca do Exu voava suplicando amparo ao povo flagelado, Vicelmo irradiava notícias do sul, outras terras bem longe dali, onde morava o Governo que ia nos acudir.
O sertão é povoado de heróis.
Em meus tempos de menino vi a fulô do mandacaru fulorar na seca,
vi o avoar do carcará que é bicho danado, rei dos céus.
Dona Das dores pegou pra mais de duzentos meninos na porta do nascimento,
O carcará é rei dos céus do sertão e pega menino pequeno que se aventura nos monturos.
Xô, bicho malvado, xô. Tem que botar sarro de cachimbo no umbigo que é pra sarar logo,
mas também pra espantar o bicho do céu, ave de rapina.
Cresci assim, respeitando essas coisas de sabedoria infinita, vendo surgir meus heróis do sertão.
O sertão pariu Virgulino e Cego Aderaldo, Patativa e Vitalino, Gonzagão e Normando, Abidoral e Dihelson.
Padim Ciço ta lá, de olho espichado vendo tudo, dando proteção ao sertanejo e inspiração a nossos ídolos.
Assim cresci naquele solo poderoso, vivi minha adolescência e meus heróis.
Uma Patativa cantava lá pros lados do Assaré, a Asa Branca de Exu voava nos céus do Brasil.
Tio Chico Recanto, o profeta, dizia coisas ruins daqueles anos, ele via no sereno da madrugada.
Eu ia às novenas sem interesse nas rezas, trajando minha única camisa azul de volta-ao-mundo,
E aquele espetáculo de vozes à capela, nas noites de novenas, ainda enchem os ouvidos das minhas lembranças.
Ali eu assisti meus primeiros concertos musicais. Depois do show voltava para casa,
Os dias brancos iam e vinham, quentes, bafejando mormaço, dando relâmpagos lá no canto do poente, enganando o sertanejo com promessas inúteis.
Eu era um menino do sertão, bicho manso embrutecendo nas capoeiras, com a alma inundada de cantiga de novena, achando que o sertão era do tamanho do mundo, grande e rachado, e todas as águas estavam represadas num tal açude de Óros, que nas conversas de meninos era maior que todos os oceanos juntos.
A poeira dos caminhos, que só davam pro Crato, redemoinhava no vento da boca da noite, levando o Cão no miolo da carrapeta de vento, forçando a gente a fazer o sinal da cruz.
E foi num giro de vento desses que chegaram os cantadores repentistas, meus primeiros heróis.
Contaram histórias em rimas ligeiras, desafios improvisados, causos de príncipes valentes de reinos mais longe que o Juazeiro.
Depois foram embora num vento que deu de madrugada. E veio o circo São Jorge. O maior circo do mundo, gritava o palhaço se equilibrando em pernas de paus.
Pra nósos meninos do sertão, O PALHAÇO NA PERNA DE PAU ERA UM DO NOSSOS HEROI
Seguíamos o nosso novo herói rua afora, fazendo festa, protegendo a marca de carimbo decalcada no dorso da mão, que nos dava direito à entrada grátis.
E o circo foi embora prometendo voltar, jamais voltou. Então inventávamos outras vadiagens para esquecer a espera inútil.
O sertão era imenso, a maior de todas as terras. E vinha na poeira dos caminhos os homens de gibão. Tangiam boiadas magras, bebiam cachaça e davam aboios tristes que me faziam querer chorar.
Não sei se eram homens, se eram lendas, só sei que amei aqueles seres bárbaros.
A lua mora no sertão e pouco sai de lá para visitar outras terras. Acho mesmo que foi o sertão quem pariu a lua, ou o inverso, porque lá ela se acende como uma coivara em chamas no céu.
E se dá aos bichos da caatinga, aos amantes, alumia os caminhos por onde andou Lampião e seu bando de justiceiros. Alumia as calçadas, as ruas, os alpendres, invade as casas na hora de dormir, pelos buracos das paredes de taipas. A lua é intrusa, mãe do sertão, ou filha, parceira do Caipora. E um dia eu descobri que a lua do sertão é o melhor presente que se dá a uma namorada.
E era sob o olhar majestoso da lua que eu ouvia as histórias dos cangaceiros, homens destemidos, mulheres valentes. E no dia seguinte dávamos vida a esses nossos heróis, em nossas brincadeiras de cangaço e volante.
Se aprendia a soletrar o be a ba no cordel, nossa cartilha encantada. Aí o sertão era pequeno pra tanta história bonita.
O sertão ardia feito brasa de angico em fogueira de São João. Não dava chuva, só relâmpagos inúteis no canto do poente.
A asa branca do Exu voava suplicando amparo ao povo flagelado, Vicelmo irradiava notícias do sul, outras terras bem longe dali, onde morava o Governo que ia nos acudir.
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
Para quem é pai/mãe e para aqueles que o serão...
Autor desconhecido
Há um período em que os pais vão ficando órfãos dos seus próprios filhos.
É que as crianças crescem independentes de nós, como árvores tagarelas e pássaros estabanados.
Crescem sem pedir licença à vida. Crescem com uma estridência alegre e, às vezes, com alardeada arrogância. Mas não crescem todos os dias de igual maneira. Crescem de repente.
Um dia sentam-se perto de você no terraço e dizem uma frase com tal maturidade que você sente que não pode mais trocar as fraldas daquela criatura.
Onde é que andou crescendo aquela danadinha que você não percebeu? Cadê a pazinha de brincar de areia, as festinhas de aniversário com palhaços e o primeiro uniforme do maternal? A criança está crescendo num ritual de obediência orgânica e desobediência civil. E você está agora ali, na porta da discoteca, esperando que ela não apenas cresça, mas apareça! Ali, estão muitos pais ao volante, esperando que eles saiam esfuziantes sobre patins e cabelos longos, soltos. Entre hambúrgueres e refrigerantes nas esquinas, lá estão nossos filhos com uniforme de sua geração: incômodas mochilas da moda nos ombros. Ali estamos, com os cabelos esbranquiçados. Esses são os filhos que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos ventos, das colheitas, das notícias e da ditadura das horas. E eles crescem meio amestrados, observando e aprendendo com nossos acertos e erros. Principalmente com os erros que esperamos que não repitam.
Há um período em que os pais vão ficando um pouco órfãos dos próprios filhos. Não mais os pegaremos nas portas das discotecas e das festas. Passou o tempo do ballet, do inglês, da natação e do judô. Saíram do banco de trás e passaram para o volante de suas próprias vidas.
Deveríamos ter ido mais à cama deles ao anoitecer para ouvir sua alma respirando conversas e confidências entre os lençóis da infância, e os adolescentes cobertores daquele quarto cheio de adesivos, pôsteres, agendas coloridas e discos ensurdecedores. Não os levamos suficientemente ao Playcenter, ao shopping, não lhes demos suficientes hambúrgueres e cocas, não lhes compramos todos os sorvetes e roupas que gostaríamos de ter comprado. Eles cresceram sem que esgotássemos neles todo o nosso afeto.
No princípio, subiam a serra e iam à casa de praia entre embrulhos, bolachas, engarrafamentos, natais, páscoas, piscinas e amiguinhos.
Sim, havia as brigas dentro do carro, a disputa pela janela, os pedidos de chicletes e cantorias sem fim. Depois chegou o tempo em que viajar com os pais começou a ser um esforço, um sofrimento, pois era impossível deixar a turma e os primeiros namorados.
Os pais ficaram exilados dos filhos. Tinham a solidão que sempre desejaram, mas, de repente, morriam de saudades daquelas “pestes”. Chega o momento em que só nos resta ficar de longe torcendo e rezando muito (nessa hora, se a gente tinha desaprendido, reaprende a rezar) para que eles acertem nas escolhas em busca de felicidade. E que conquistem do modo mais completo possível. O jeito é esperar: qualquer hora podem nos dar netos. O neto é a hora do carinho ocioso e estocado, não exercido nos próprios filhos e que não pode morrer conosco. Por isso os avós são tão desmesurados e distribuem tão incontrolável carinho. Os netos são a última oportunidade de reeditar o nosso afeto. Por isso é necessário fazer alguma coisa a mais, antes que eles cresçam.
Aprendemos a ser filhos depois que somos pais. Só aprendemos a ser pais depois que somos avós..."
Há um período em que os pais vão ficando órfãos dos seus próprios filhos.
É que as crianças crescem independentes de nós, como árvores tagarelas e pássaros estabanados.
Crescem sem pedir licença à vida. Crescem com uma estridência alegre e, às vezes, com alardeada arrogância. Mas não crescem todos os dias de igual maneira. Crescem de repente.
Um dia sentam-se perto de você no terraço e dizem uma frase com tal maturidade que você sente que não pode mais trocar as fraldas daquela criatura.
Onde é que andou crescendo aquela danadinha que você não percebeu? Cadê a pazinha de brincar de areia, as festinhas de aniversário com palhaços e o primeiro uniforme do maternal? A criança está crescendo num ritual de obediência orgânica e desobediência civil. E você está agora ali, na porta da discoteca, esperando que ela não apenas cresça, mas apareça! Ali, estão muitos pais ao volante, esperando que eles saiam esfuziantes sobre patins e cabelos longos, soltos. Entre hambúrgueres e refrigerantes nas esquinas, lá estão nossos filhos com uniforme de sua geração: incômodas mochilas da moda nos ombros. Ali estamos, com os cabelos esbranquiçados. Esses são os filhos que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos ventos, das colheitas, das notícias e da ditadura das horas. E eles crescem meio amestrados, observando e aprendendo com nossos acertos e erros. Principalmente com os erros que esperamos que não repitam.
Há um período em que os pais vão ficando um pouco órfãos dos próprios filhos. Não mais os pegaremos nas portas das discotecas e das festas. Passou o tempo do ballet, do inglês, da natação e do judô. Saíram do banco de trás e passaram para o volante de suas próprias vidas.
Deveríamos ter ido mais à cama deles ao anoitecer para ouvir sua alma respirando conversas e confidências entre os lençóis da infância, e os adolescentes cobertores daquele quarto cheio de adesivos, pôsteres, agendas coloridas e discos ensurdecedores. Não os levamos suficientemente ao Playcenter, ao shopping, não lhes demos suficientes hambúrgueres e cocas, não lhes compramos todos os sorvetes e roupas que gostaríamos de ter comprado. Eles cresceram sem que esgotássemos neles todo o nosso afeto.
No princípio, subiam a serra e iam à casa de praia entre embrulhos, bolachas, engarrafamentos, natais, páscoas, piscinas e amiguinhos.
Sim, havia as brigas dentro do carro, a disputa pela janela, os pedidos de chicletes e cantorias sem fim. Depois chegou o tempo em que viajar com os pais começou a ser um esforço, um sofrimento, pois era impossível deixar a turma e os primeiros namorados.
Os pais ficaram exilados dos filhos. Tinham a solidão que sempre desejaram, mas, de repente, morriam de saudades daquelas “pestes”. Chega o momento em que só nos resta ficar de longe torcendo e rezando muito (nessa hora, se a gente tinha desaprendido, reaprende a rezar) para que eles acertem nas escolhas em busca de felicidade. E que conquistem do modo mais completo possível. O jeito é esperar: qualquer hora podem nos dar netos. O neto é a hora do carinho ocioso e estocado, não exercido nos próprios filhos e que não pode morrer conosco. Por isso os avós são tão desmesurados e distribuem tão incontrolável carinho. Os netos são a última oportunidade de reeditar o nosso afeto. Por isso é necessário fazer alguma coisa a mais, antes que eles cresçam.
Aprendemos a ser filhos depois que somos pais. Só aprendemos a ser pais depois que somos avós..."
domingo, 6 de setembro de 2009
Sentar-se à Janela
(Alexandre Garcia)
Era criança quando, pela primeira vez, entrei em um avião.
A ansiedade de voar era enorme.
Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer jeito, acompanhar o vôo
desde o primeiro momento e sentir o avião correndo na pista cada vez mais
rápido até a decolagem.
Ao olhar pela janela via, sem palavras, o avião rompendo as nuvens,
chegando ao céu azul. Tudo era novidade e fantasia.
Cresci, me formei, e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde o
início, voar era uma necessidade constante.
As reuniões em outras cidades e a correria me obrigavam, às vezes, a
estar em dois lugares num mesmo dia.
No início pedia sempre poltronas ao lado da janela, e, ainda com olhos de
menino, fitava as nuvens, curtia a viagem, e nem me incomodava de esperar
um pouco mais para sair do avião, pegar a bagagem, coisa e tal.
O tempo foi passando, a correria aumentando, e já não fazia questão de me
sentar à janela, nem mesmo de ver as nuvens, o sol, as cidades abaixo, o
mar ou qualquer paisagem que fosse.
Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair, me acomodar rápido e
sair rápido.
As poltronas do corredor agora eram exigência . Mais fáceis para sair sem
ter que esperar ninguém, sempre e sempre preocupado com a hora, com o
compromisso, com tudo, menos com a viagem, com a paisagem, comigo mesmo.
Por um desses maravilhosos 'acasos' do destino, estava eu louco para
voltar de São Paulo numa tarde chuvosa, precisando chegar em Curitiba o
mais rápido possível.
O vôo estava lotado e o único lugar disponível era uma janela, na última
poltrona. Sem pensar concordei de imediato, peguei meu bilhete e fui para
o embarque.
Embarquei no avião, me acomodei na poltrona indicada: a janela. Janela
que há muito eu não via, ou melhor, pela qual já não me preocupava em
olhar.
E, num rompante, assim que o avião decolou, lembrei-me da primeira vez
que voara. Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade, aquele frio
na barriga. Olhava o avião rompendo as nuvens escuras até que, tendo
passado pela chuva, apareceu o céu.
Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto. E também o sol, que
brilhava como se tivesse acabado de nascer.
Naquele instante, em que voltei a ser criança, percebi que estava
deixando de viver um pouco a cada viagem em que desprezava aquela vista.
Pensei comigo mesmo: será que em relação às outras coisas da minha vida
eu também não havia deixado de me sentar à janela, como, por exemplo,
olhar pela janela das minhas amizades, do meu casamento, do meu trabalho e
convívio pessoal?
Creio que aos poucos, e mesmo sem perceber, deixamos de olhar pela janela
da nossa vida.
A vida também é uma viagem e se não nos sentarmos à janela, perdemos o
que há de melhor: as paisagens, que são nossos amores, alegrias,
tristezas, enfim, tudo o que nos mantém vivos.
Se viajarmos somente na poltrona do corredor, com pressa de chegar,
sabe-se lá aonde, perderemos a oportunidade de apreciar as belezas que a
viagem nos oferece.
Se você também está num ritmo acelerado, pedindo sempre poltronas do
corredor, para embarcar e desembarcar rápido e 'ganhar tempo', pare um
pouco e reflita sobre aonde você quer chegar.
A aeronave da nossa existência voa célere e a duração da viagem não é
anunciada pelo comandante. Não sabemos quanto tempo ainda nos resta. Por
essa razão, vale a pena sentar próximo da janela para não perder nenhum
detalhe.
Afinal...
"A vida, a felicidade e a paz são caminhos e não destinos"
Era criança quando, pela primeira vez, entrei em um avião.
A ansiedade de voar era enorme.
Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer jeito, acompanhar o vôo
desde o primeiro momento e sentir o avião correndo na pista cada vez mais
rápido até a decolagem.
Ao olhar pela janela via, sem palavras, o avião rompendo as nuvens,
chegando ao céu azul. Tudo era novidade e fantasia.
Cresci, me formei, e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde o
início, voar era uma necessidade constante.
As reuniões em outras cidades e a correria me obrigavam, às vezes, a
estar em dois lugares num mesmo dia.
No início pedia sempre poltronas ao lado da janela, e, ainda com olhos de
menino, fitava as nuvens, curtia a viagem, e nem me incomodava de esperar
um pouco mais para sair do avião, pegar a bagagem, coisa e tal.
O tempo foi passando, a correria aumentando, e já não fazia questão de me
sentar à janela, nem mesmo de ver as nuvens, o sol, as cidades abaixo, o
mar ou qualquer paisagem que fosse.
Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair, me acomodar rápido e
sair rápido.
As poltronas do corredor agora eram exigência . Mais fáceis para sair sem
ter que esperar ninguém, sempre e sempre preocupado com a hora, com o
compromisso, com tudo, menos com a viagem, com a paisagem, comigo mesmo.
Por um desses maravilhosos 'acasos' do destino, estava eu louco para
voltar de São Paulo numa tarde chuvosa, precisando chegar em Curitiba o
mais rápido possível.
O vôo estava lotado e o único lugar disponível era uma janela, na última
poltrona. Sem pensar concordei de imediato, peguei meu bilhete e fui para
o embarque.
Embarquei no avião, me acomodei na poltrona indicada: a janela. Janela
que há muito eu não via, ou melhor, pela qual já não me preocupava em
olhar.
E, num rompante, assim que o avião decolou, lembrei-me da primeira vez
que voara. Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade, aquele frio
na barriga. Olhava o avião rompendo as nuvens escuras até que, tendo
passado pela chuva, apareceu o céu.
Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto. E também o sol, que
brilhava como se tivesse acabado de nascer.
Naquele instante, em que voltei a ser criança, percebi que estava
deixando de viver um pouco a cada viagem em que desprezava aquela vista.
Pensei comigo mesmo: será que em relação às outras coisas da minha vida
eu também não havia deixado de me sentar à janela, como, por exemplo,
olhar pela janela das minhas amizades, do meu casamento, do meu trabalho e
convívio pessoal?
Creio que aos poucos, e mesmo sem perceber, deixamos de olhar pela janela
da nossa vida.
A vida também é uma viagem e se não nos sentarmos à janela, perdemos o
que há de melhor: as paisagens, que são nossos amores, alegrias,
tristezas, enfim, tudo o que nos mantém vivos.
Se viajarmos somente na poltrona do corredor, com pressa de chegar,
sabe-se lá aonde, perderemos a oportunidade de apreciar as belezas que a
viagem nos oferece.
Se você também está num ritmo acelerado, pedindo sempre poltronas do
corredor, para embarcar e desembarcar rápido e 'ganhar tempo', pare um
pouco e reflita sobre aonde você quer chegar.
A aeronave da nossa existência voa célere e a duração da viagem não é
anunciada pelo comandante. Não sabemos quanto tempo ainda nos resta. Por
essa razão, vale a pena sentar próximo da janela para não perder nenhum
detalhe.
Afinal...
"A vida, a felicidade e a paz são caminhos e não destinos"
terça-feira, 11 de agosto de 2009
QUASE...
João Almeida
E tem dias que eu quase acredito...
Quase.
Me recomponho,
enxergo bem até o que vem
depois do morro...
A visão imposta por pensamentos
se dissipa! se apaga...
O trem passa sem parar,
então não há desembarques....
e também não há partidas...
Mas era preciso
que houvessem chegadas
e também saídas...
Assim como uma dor que passa
e uma alegria que chega.
E tem dias que eu quase acredito!
Quase....
Mas existem surpresas
e é assim que amanheço...
Quase....
Cheguei a ver a sombra
de um velho sonho chegando,
realizado!
Mas desapareceu
como que batendo asas...
Quem sabe um dia acontece...
nisso eu ainda acredito,
no meu Papai Noel fora de época
em qualquer dia
que seja natal na minha vida.
E tem dias que eu quase acredito...
Quase.
Me recomponho,
enxergo bem até o que vem
depois do morro...
A visão imposta por pensamentos
se dissipa! se apaga...
O trem passa sem parar,
então não há desembarques....
e também não há partidas...
Mas era preciso
que houvessem chegadas
e também saídas...
Assim como uma dor que passa
e uma alegria que chega.
E tem dias que eu quase acredito!
Quase....
Mas existem surpresas
e é assim que amanheço...
Quase....
Cheguei a ver a sombra
de um velho sonho chegando,
realizado!
Mas desapareceu
como que batendo asas...
Quem sabe um dia acontece...
nisso eu ainda acredito,
no meu Papai Noel fora de época
em qualquer dia
que seja natal na minha vida.
segunda-feira, 3 de agosto de 2009
Crônica de uma quarta-feira comum
Do blogão do Zé (Folha de São Paulo)
A Henry Chinaski
Hoje é mais uma das quartas-feiras que enfrento na maior ressaca e muita preguiça. Nenhuma nuvem no céu. Nenhuma nuvem no meu coração, ressequido e triste como um saco plástico de supermercado à beira de uma estrada empoeirada que não leva a lugar nenhum. A água gelada do chuveiro tenta me ressuscitar. Preciso trabalhar.
Rasguei os poemas bêbados feitos de madrugada, escrevi-os com a caneta tonta da melancolia. Ah! Estou relendo Crônicas de um Amor Louco, de Charles Bukowsky. Depois de 28 anos, pego o livro de volta e viajo com o velho bêbado, lírico e ácido. Certa vez, meu irmão, Paulo César Cascão, depois de sorver um gole de um bom vinho alentejano, usou do seu ferino humor e soltou essa: "Não posso ler Bukowsky porque tenho medo do Detran". Mas eu não estou nem aí. Sigo com minha poesia e meus vícios.
Me enxugo e estou refeito para o trabalho. Só o coração continua apertado, deve ser por causa da Lua cheia que se aproxima — dia 16 é Lua gorda, mermão!
O trânsito parado testa o meu humor. Fecho os vidros e aumento o som do rádio para não xingar ninguém, nenhum panaca que insiste em ser mais esperto que os outros. E o rádio toca Chico:
Mesmo que os cantores sejam falsos como eu
serão bonitas, não importa
são bonitas as canções
mesmo miseráveis os poetas
os seus versos serão bons
mesmo porque as notas eram surdas
quando um deus sonso e ladrão
fez das tripas a primeira lira
que animou todos os sons
e daí nasceram as baladas
e os arroubos de bandidos como eu
cantando assim:
você nasceu para mim
você nasceu para mim
mesmo que você feche os ouvidos
e as janelas do vestido
minha musa vai cair em tentação
mesmo porque estou falando grego
com sua imaginação
mesmo que você fuja de mim
por labirintos e alçapões
saiba que os poetas como os cegos
podem ver na escuridão
e eis que, menos sábios do que antes
os seus lábios ofegantes
hão de se entregar assim:
me leve até o fim
me leve até o fim
mesmo que os romances sejam falsos como o nosso
são bonitas, não importa
são bonitas as canções
mesmo sendo errados os amantes
seus amores serão bons
Choro Bandido, diz o locutor. Esse é o nome da música que Chico Buarque e Edu Lobo fizeram para a peça O Corsário do Rei, de Augusto Boal, em 1965. Por um instante vejo o rosto dela na silhueta de um táxi. Ela, a mira dos meus poemas, nem sabe que estou aqui, nesse engarrafamento, de ressaca, cansado, indo para o trabalho, uma formiga tosca e inútil no meio do Planalto Central. Acelero, o pardal me multa. Mesmo assim, chego atrasado no trabalho. A música de Chico não me sai da cabeça…
A Henry Chinaski
Hoje é mais uma das quartas-feiras que enfrento na maior ressaca e muita preguiça. Nenhuma nuvem no céu. Nenhuma nuvem no meu coração, ressequido e triste como um saco plástico de supermercado à beira de uma estrada empoeirada que não leva a lugar nenhum. A água gelada do chuveiro tenta me ressuscitar. Preciso trabalhar.
Rasguei os poemas bêbados feitos de madrugada, escrevi-os com a caneta tonta da melancolia. Ah! Estou relendo Crônicas de um Amor Louco, de Charles Bukowsky. Depois de 28 anos, pego o livro de volta e viajo com o velho bêbado, lírico e ácido. Certa vez, meu irmão, Paulo César Cascão, depois de sorver um gole de um bom vinho alentejano, usou do seu ferino humor e soltou essa: "Não posso ler Bukowsky porque tenho medo do Detran". Mas eu não estou nem aí. Sigo com minha poesia e meus vícios.
Me enxugo e estou refeito para o trabalho. Só o coração continua apertado, deve ser por causa da Lua cheia que se aproxima — dia 16 é Lua gorda, mermão!
O trânsito parado testa o meu humor. Fecho os vidros e aumento o som do rádio para não xingar ninguém, nenhum panaca que insiste em ser mais esperto que os outros. E o rádio toca Chico:
Mesmo que os cantores sejam falsos como eu
serão bonitas, não importa
são bonitas as canções
mesmo miseráveis os poetas
os seus versos serão bons
mesmo porque as notas eram surdas
quando um deus sonso e ladrão
fez das tripas a primeira lira
que animou todos os sons
e daí nasceram as baladas
e os arroubos de bandidos como eu
cantando assim:
você nasceu para mim
você nasceu para mim
mesmo que você feche os ouvidos
e as janelas do vestido
minha musa vai cair em tentação
mesmo porque estou falando grego
com sua imaginação
mesmo que você fuja de mim
por labirintos e alçapões
saiba que os poetas como os cegos
podem ver na escuridão
e eis que, menos sábios do que antes
os seus lábios ofegantes
hão de se entregar assim:
me leve até o fim
me leve até o fim
mesmo que os romances sejam falsos como o nosso
são bonitas, não importa
são bonitas as canções
mesmo sendo errados os amantes
seus amores serão bons
Choro Bandido, diz o locutor. Esse é o nome da música que Chico Buarque e Edu Lobo fizeram para a peça O Corsário do Rei, de Augusto Boal, em 1965. Por um instante vejo o rosto dela na silhueta de um táxi. Ela, a mira dos meus poemas, nem sabe que estou aqui, nesse engarrafamento, de ressaca, cansado, indo para o trabalho, uma formiga tosca e inútil no meio do Planalto Central. Acelero, o pardal me multa. Mesmo assim, chego atrasado no trabalho. A música de Chico não me sai da cabeça…
sábado, 25 de julho de 2009
LONAS AZUIS
RAUL GIL
No caminho da sorte,
A alma perdi,
Dei um beijo na morte,
E sobrevivi,
Mas perdi o meu medo,
A viver aprendi...
Fiz do mundo meu palco,
Do sol minha luz,
Pra fazer o meu circo,
Usei minha cruz,
De um pedaço de céu,
Fiz as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis.
Aprendi que nem sempre,
É feliz quem procura,
Que a vida mais fácil,
Também é a mais dura,
Que a estrada mais curta,
É também mais escura.
Fiz do mundo meu palco,
Do sol minha luz,
Pra fazer o meu circo,
Usei minha cruz,
De um pedaço de céu,
Fiz as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis.
Aprendi na descida,
Mais forças ganhar,
Pra chegar na subida,
E não desanimar,
Sou na vida um artista, ganhei meu lugar.
Fiz do mundo meu palco,
Do sol minha luz,
Pra fazer o meu circo,
Usei minha cruz,
De um pedaço de céu,
Fiz as lonas azuis.
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis....
No caminho da sorte,
A alma perdi,
Dei um beijo na morte,
E sobrevivi,
Mas perdi o meu medo,
A viver aprendi...
Fiz do mundo meu palco,
Do sol minha luz,
Pra fazer o meu circo,
Usei minha cruz,
De um pedaço de céu,
Fiz as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis.
Aprendi que nem sempre,
É feliz quem procura,
Que a vida mais fácil,
Também é a mais dura,
Que a estrada mais curta,
É também mais escura.
Fiz do mundo meu palco,
Do sol minha luz,
Pra fazer o meu circo,
Usei minha cruz,
De um pedaço de céu,
Fiz as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis.
Aprendi na descida,
Mais forças ganhar,
Pra chegar na subida,
E não desanimar,
Sou na vida um artista, ganhei meu lugar.
Fiz do mundo meu palco,
Do sol minha luz,
Pra fazer o meu circo,
Usei minha cruz,
De um pedaço de céu,
Fiz as lonas azuis.
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis,
Do céu, eu fiz, as lonas azuis....
quarta-feira, 22 de julho de 2009
ASSIM VOU EU
Paty Padilha
Assim vou eu...
Dobrando minhas esquinas,
Aguçando meus sentidos.
Escrevendo meus poemas,
Criando meus laços, Apertando meus nós,
Alimentando minhas fantasias,
Aperfeiçoando meus traços,
Aquietando minh’alma,
Curando minhas feridas,
Desviando das pedras do meu caminho,
Admitindo meus erros,
Ateando minhas velas,
Traçando minhas retas,
Vasculhando minhas gavetas,
Ostentando meus amores,
Engrandecendo meus sentimentos,
Apurando meus gostos,
Amadurecendo minha vida,
Eu vou...
Assim vou eu...
Dobrando minhas esquinas,
Aguçando meus sentidos.
Escrevendo meus poemas,
Criando meus laços, Apertando meus nós,
Alimentando minhas fantasias,
Aperfeiçoando meus traços,
Aquietando minh’alma,
Curando minhas feridas,
Desviando das pedras do meu caminho,
Admitindo meus erros,
Ateando minhas velas,
Traçando minhas retas,
Vasculhando minhas gavetas,
Ostentando meus amores,
Engrandecendo meus sentimentos,
Apurando meus gostos,
Amadurecendo minha vida,
Eu vou...
sábado, 18 de julho de 2009
PASSOS NA REALIDADE
João Almeida
Há quem diga o bom,
e quem,
o ruim pra mim,
enfim há quem me esqueceu
mas tem quem se lembre
de mim.
Existem as minhas besteiras,
mas espalhei pegadas firmes,
apaguei incêndios,
mas ascendi fogueiras,
espantei o frio,
fugi da chuva
mas mergulhei no rio.
Já me calei, só fiz ouvi
E já cantei só pra mim.
Enfim, os dias são assim.
Quando nem...
Lá estão as estrelas bailarinas
na escuridão do verão
chamando a atenção
para o mais bonito dos céus...
Quando não...
em qualquer ocasião
pingam tristezas
por quanto , em qualquer canto.
Mas há quem viva
a vida inteira,
e o dito bem dito pelo poeta?
Há quem passe pelo bosque
E só veja lenha para a fogueira...
Há quem diga o bom,
e quem,
o ruim pra mim,
enfim há quem me esqueceu
mas tem quem se lembre
de mim.
Existem as minhas besteiras,
mas espalhei pegadas firmes,
apaguei incêndios,
mas ascendi fogueiras,
espantei o frio,
fugi da chuva
mas mergulhei no rio.
Já me calei, só fiz ouvi
E já cantei só pra mim.
Enfim, os dias são assim.
Quando nem...
Lá estão as estrelas bailarinas
na escuridão do verão
chamando a atenção
para o mais bonito dos céus...
Quando não...
em qualquer ocasião
pingam tristezas
por quanto , em qualquer canto.
Mas há quem viva
a vida inteira,
e o dito bem dito pelo poeta?
Há quem passe pelo bosque
E só veja lenha para a fogueira...
terça-feira, 14 de julho de 2009
SAUADADES DE GABRIEL
João Almeida
GABRIEL!
Nome dado por minha neta Carol a um galo muito especial. Nasceu só, a ninhada esperada não vingou, todos os ovos “goraram” menos o que lhe envolvia. Assim desde pequenininho me deu trabalho, fugia do galinheiro, embrenhava-se pelo mato e eu tropeçando atrás. Foi crescendo formando a plumagem que brilhava parecendo ouro e por fim se fez dono do terreiro, autoritário e garanhão. Os outros galos eram subordinados, só comiam depois da sua permissão, só faziam amor se ele estivesse desatento, caso contrário derrubava o rival das costas das galinhas, ele porem, passava o tempo cobrindo as meninas. Um galo e tanto esse GABRIEL. Mas o tempo passa, até para os bichos ele impõe marcas. Cheguei no sítio e fui jogar uma mão de milho e encontrei GABRIEL acocorado. Onde já se viu um galo como GABRIEL agachado. Quando os caroços de milho se espalharam no piquete ele veio comer, achei extranho suas passadas algo errado estava acontecendo, o meu colaborador estava diferente, parecia bem doente. Procurei informações e disseram que era uma perna que estava doente. Passaram se os dias e viajei para buscar minhas netas para passar as férias de junho no sítio e no retorno como sempre faço fui olhar o galinheiro, jogar uma mão de milho e então retrocedi, não abri a mão , abri bem os olhos e então vi Gabriel estirado, morto. Corri e contei a Maria e procurei esconder das meninas e fui providenciar enterrar o amigo GABRIEL.
O galinheiro continua no sítio, mas está muito diferente, nunca mais será o mesmo sem GABRIEL.
Sitio do Meio 2 de julho de 2009.
segunda-feira, 6 de julho de 2009
POR QUE?
João Almeida
Você!
horas me ajudas a subir.
Noutras
me empuras ladeira abaixo.
Horas me beijas,
noutras
me apedrejas...
Horas me faz sorrir
noutras
me faz chorar.
Horas me faz seguir
noutras
a desistir
Horas me queres tanto
noutras
nem tanto
Pois horas diz:
te amo! te amo! te amo!
Noutras parece odiar
As vezes penso....
Tantos anos e eu não aprendi
não aprendi nada sobre
amar,
Agora envelhecido,
Fechei meu caderno
Não tenho mais o que apontar.
O engano de tantos anos
aos meus sentimentos
não sei que nome dar.
Você!
horas me ajudas a subir.
Noutras
me empuras ladeira abaixo.
Horas me beijas,
noutras
me apedrejas...
Horas me faz sorrir
noutras
me faz chorar.
Horas me faz seguir
noutras
a desistir
Horas me queres tanto
noutras
nem tanto
Pois horas diz:
te amo! te amo! te amo!
Noutras parece odiar
As vezes penso....
Tantos anos e eu não aprendi
não aprendi nada sobre
amar,
Agora envelhecido,
Fechei meu caderno
Não tenho mais o que apontar.
O engano de tantos anos
aos meus sentimentos
não sei que nome dar.
segunda-feira, 8 de junho de 2009
ALMAS PERFUMADAS
CARLOS DRUMMOND ANDRADE
Tem gente que tem cheiro de passarinho quando canta.
De sol quando acorda.
De flor quando ri.
Ao lado delas, a gente se sente no balanço de uma rede
que dança gostoso numa tarde grande, sem relógio e sem
agenda.
Ao lado delas, a gente se sente comendo pipoca na praça.
Lambuzando o queixo de sorvete.
Melando os dedos com algodão doce da cor mais doce que
tem pra escolher.
O tempo é outro.
E a vida fica com a cara que ela tem de verdade,
mas que a gente desaprende de ver.
Tem gente que tem cheiro de colo de Deus.
De banho de mar quando a água é quente e o céu é azul.
Ao lado delas,
a gente sabe que os anjos existem e que alguns são
invisíveis.
Ao lado delas,
a gente se sente chegando em casa e trocando o salto
pelo chinelo.
Sonhando a maior tolice do mundo com o gozo de quem
não liga pra isso.
Ao lado delas, pode ser abril, mas parece manhã de Natal
do tempo em que a gente acordava
e encontrava o presente do Papai Noel.
Tem gente que tem cheiro das estrelas que Deus acendeu
no céu e daquelas que conseguimos acender na Terra.
Ao lado delas, a gente não acha que o amor é possível, a
gente tem certeza.
Ao lado delas, a gente se sente visitando um lugar feito
de alegria.
Recebendo um buquê de carinhos.
Abraçando um filhote de urso panda.
Tocando com os olhos os olhos da paz. 22/10/08 Bell...***
Ao lado delas, saboreamos a delícia do toque suave que sua
presença sopra no nosso coração.
Tem gente que tem cheiro de cafuné sem pressa.
Do brinquedo que a gente não largava.
Do acalanto que o silêncio canta.
De passeio no jardim.
Ao lado delas,
a gente percebe que a sensualidade é um perfume que vem de
dentro e que a atração que realmente nos move não passa só
pelo corpo.
Corre em outras veias.
Pulsa em outro lugar.
Ao lado delas, a gente lembra que no instante em que rimos,
Deus está conosco, juntinho ao nosso lado.
E a gente ri grande que nem menino arteiro.
Tem gente como você que nem percebe como tem a alma
Perfumada!
E que esse perfume é dom de Deus.
Tem gente que tem cheiro de passarinho quando canta.
De sol quando acorda.
De flor quando ri.
Ao lado delas, a gente se sente no balanço de uma rede
que dança gostoso numa tarde grande, sem relógio e sem
agenda.
Ao lado delas, a gente se sente comendo pipoca na praça.
Lambuzando o queixo de sorvete.
Melando os dedos com algodão doce da cor mais doce que
tem pra escolher.
O tempo é outro.
E a vida fica com a cara que ela tem de verdade,
mas que a gente desaprende de ver.
Tem gente que tem cheiro de colo de Deus.
De banho de mar quando a água é quente e o céu é azul.
Ao lado delas,
a gente sabe que os anjos existem e que alguns são
invisíveis.
Ao lado delas,
a gente se sente chegando em casa e trocando o salto
pelo chinelo.
Sonhando a maior tolice do mundo com o gozo de quem
não liga pra isso.
Ao lado delas, pode ser abril, mas parece manhã de Natal
do tempo em que a gente acordava
e encontrava o presente do Papai Noel.
Tem gente que tem cheiro das estrelas que Deus acendeu
no céu e daquelas que conseguimos acender na Terra.
Ao lado delas, a gente não acha que o amor é possível, a
gente tem certeza.
Ao lado delas, a gente se sente visitando um lugar feito
de alegria.
Recebendo um buquê de carinhos.
Abraçando um filhote de urso panda.
Tocando com os olhos os olhos da paz. 22/10/08 Bell...***
Ao lado delas, saboreamos a delícia do toque suave que sua
presença sopra no nosso coração.
Tem gente que tem cheiro de cafuné sem pressa.
Do brinquedo que a gente não largava.
Do acalanto que o silêncio canta.
De passeio no jardim.
Ao lado delas,
a gente percebe que a sensualidade é um perfume que vem de
dentro e que a atração que realmente nos move não passa só
pelo corpo.
Corre em outras veias.
Pulsa em outro lugar.
Ao lado delas, a gente lembra que no instante em que rimos,
Deus está conosco, juntinho ao nosso lado.
E a gente ri grande que nem menino arteiro.
Tem gente como você que nem percebe como tem a alma
Perfumada!
E que esse perfume é dom de Deus.
sexta-feira, 30 de janeiro de 2009
A ALMA NÃO PRECISA DE ÔMEGA 3
MIGUEL FALABELLA
As noites de insônia, em pleno verão que aprisiona a cidade na onda de calor, não costumam ser profícuas. Ao contrário, geralmente estendem-se lânguidas e vagarosas sobre a cama do estio, fitando o céu sem estrelas, à espera do dia seguinte. Há certas noites, como a de hoje, por exemplo, quando me sento para escrever a crônica, em que tudo é silêncio. Não há vento e a cidade parece ressentir-se do calor extremo. Não há nada, nem ninguém nas ruas. Na varanda, olho os mistérios do cosmo e penso no quão facilmente nos esquecemos de que nosso velho planeta não ocupa o centro dele.
Como se a razão entendesse Copérnico, mas a emoção continuasse rendida ao geocentrismo de Ptolomeu. Enfim, divagações solitárias madrugada adentro, frutos de uma mente que não consegue operar as inúmeras funções necessárias para que simplesmente eu consiga adormecer.
Deixei as estrelas e vim para o computador, onde naveguei um pouco, atrás da inspiração para a crônica. Buscando a palavra, a história ou a saudade que me tome pela mão e me leve ao mundo das palavras. Visitei alguns poetas de que gosto, outros que conheço pouco e que ainda quero conhecer. Deveríamos todos ler um poema por dia. As escolas deveriam iniciar seus trabalhos com um poema antes da maratona de aulas. Faz bem ao coração. Durante anos alimentei a fantasia de que as cidades deveriam operar emergências poéticas. Estabelecimentos que nos devolvessem a capacidade de sonhar e adivinhar novos mundos, e que existiriam em cada bairro, abertos noite e dia, devolvendo humanidade aos pacientes. Na falta desta utopia, a internet é uma boa opção para quem, como eu, gosta de visitar a poesia regularmente.
Enfim, já tarde, bem tarde, acabei visitando Christina Rossetti, poetisa romântica inglesa que nos deixou uma obra delicada, de devoção e entrega. Rossetti foi deixada de lado pela onda modernista, mas na décadade 70, o feminismo a trouxe de volta ao panteão das letras. Cometi a heresia de traduzir um soneto dela, porque senti vontade de dividi-lo com vocês e porque trabalhar me ajuda a atravessar a noite, sem a desagradável sensação de ser o único ser acordado na cidade. A tradução não é grande coisa, mas a intenção é das melhores. De modo que a última página de hoje, para os leitores, encerra-se com poesia e, nos dias que correm, acreditem, a poesia é tão importante como o ômega 3. O corpo vai deteriorar-se mais cedo ou mais tarde, mas as centelhas de inspiração avançam pelo tempo, como a luz acesa pelo poeta. Ao soneto, então:
Aqui pensando, em tudo o que perdi,
No que teria sido e jamais será,
Tua excelência vem me assegurar,
Que não sou merecedora de ti.
A mágoa é minha, que teimo em cair,
Que teimo em morrer, que teimo em deitar,
Querendo encolher, querendo chorar
Fitando a parede pra não mais fugir
E ainda assim, porque há esperança,
Rasgando a noite, o amor avança
E luta até que amanheça o dia,
Quando, enfim, esgotada, entrego o poder
E assisto a meu coração florescer,
Pronta a aceitar que por ti morreria.
Miguel Falabella é ator, diretor, dramaturgo e autor de novelas
As noites de insônia, em pleno verão que aprisiona a cidade na onda de calor, não costumam ser profícuas. Ao contrário, geralmente estendem-se lânguidas e vagarosas sobre a cama do estio, fitando o céu sem estrelas, à espera do dia seguinte. Há certas noites, como a de hoje, por exemplo, quando me sento para escrever a crônica, em que tudo é silêncio. Não há vento e a cidade parece ressentir-se do calor extremo. Não há nada, nem ninguém nas ruas. Na varanda, olho os mistérios do cosmo e penso no quão facilmente nos esquecemos de que nosso velho planeta não ocupa o centro dele.
Como se a razão entendesse Copérnico, mas a emoção continuasse rendida ao geocentrismo de Ptolomeu. Enfim, divagações solitárias madrugada adentro, frutos de uma mente que não consegue operar as inúmeras funções necessárias para que simplesmente eu consiga adormecer.
Deixei as estrelas e vim para o computador, onde naveguei um pouco, atrás da inspiração para a crônica. Buscando a palavra, a história ou a saudade que me tome pela mão e me leve ao mundo das palavras. Visitei alguns poetas de que gosto, outros que conheço pouco e que ainda quero conhecer. Deveríamos todos ler um poema por dia. As escolas deveriam iniciar seus trabalhos com um poema antes da maratona de aulas. Faz bem ao coração. Durante anos alimentei a fantasia de que as cidades deveriam operar emergências poéticas. Estabelecimentos que nos devolvessem a capacidade de sonhar e adivinhar novos mundos, e que existiriam em cada bairro, abertos noite e dia, devolvendo humanidade aos pacientes. Na falta desta utopia, a internet é uma boa opção para quem, como eu, gosta de visitar a poesia regularmente.
Enfim, já tarde, bem tarde, acabei visitando Christina Rossetti, poetisa romântica inglesa que nos deixou uma obra delicada, de devoção e entrega. Rossetti foi deixada de lado pela onda modernista, mas na décadade 70, o feminismo a trouxe de volta ao panteão das letras. Cometi a heresia de traduzir um soneto dela, porque senti vontade de dividi-lo com vocês e porque trabalhar me ajuda a atravessar a noite, sem a desagradável sensação de ser o único ser acordado na cidade. A tradução não é grande coisa, mas a intenção é das melhores. De modo que a última página de hoje, para os leitores, encerra-se com poesia e, nos dias que correm, acreditem, a poesia é tão importante como o ômega 3. O corpo vai deteriorar-se mais cedo ou mais tarde, mas as centelhas de inspiração avançam pelo tempo, como a luz acesa pelo poeta. Ao soneto, então:
Aqui pensando, em tudo o que perdi,
No que teria sido e jamais será,
Tua excelência vem me assegurar,
Que não sou merecedora de ti.
A mágoa é minha, que teimo em cair,
Que teimo em morrer, que teimo em deitar,
Querendo encolher, querendo chorar
Fitando a parede pra não mais fugir
E ainda assim, porque há esperança,
Rasgando a noite, o amor avança
E luta até que amanheça o dia,
Quando, enfim, esgotada, entrego o poder
E assisto a meu coração florescer,
Pronta a aceitar que por ti morreria.
Miguel Falabella é ator, diretor, dramaturgo e autor de novelas
quarta-feira, 28 de janeiro de 2009
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