Com meus próprios passos saí andando
em busca do meu manancial, e ele tinha preço. Puerilmente pude
atravessar o caminho, as traves, e encontrar minhas linhas entremeio
a tanto tecido. Foram dias de chuvas e trovoadas. Sabe as agulhas e
tesouras...? O aço atrai raios. Deu medo! Mas minhas
pernas trêmulas ainda podiam me conduzir e minhas mãos davam formas aos
estopos. Lentamente e com cuidado pude escolher cada trama. A cada ponto
furei-me a pele. Mas era eu comigo. Cresci! Pude
ouvir a criatura muda e os
fantasmas que ela trazia. Não teve um dia em que Ela não estivesse lá,
até
mesmo onde parec(e)ia não estar. Quantos foram Eles os meus fantasmas?
No centro, junto aos emaranhados, eu estava lá... desatando
nós, cosendo a pele. Pude costurar o que havia remendo e atear fogo nos
panos velhos. Me vesti de mulher e do meu Desejo. Pinchei os trapos.
Desobriguei-me da
simbiose caótica e busquei a mim, tão imperfeita e digna de amor.
Prescindi do amor que nunca tive e que temia perder. Deixei-o para si e
agradeci pelo que não recebi.
Do desamor eu compreendi facilmente, já o amor para sempre me parecerá
uma
esfinge. Lembrei do encontro comigo, quando estive à beira do abismo e
pude me aproximar do nada. Tudo era asfalto e cinza como os sepulcros;
gélido e sem sentido. Tudo era mortífero e eu latejava como uma
borboleta que
caída no chão, buscava forças para bater as asas feridas. Escolhi então
a incansável busca do segredo, mesmo para sempre ele estivesse perdido.
Quero estar sempre diante do mistério da vida e do mistério do amor,
apesar de toda transitoriedade. Como as ondas do mar que em vão buscam
contornar a areia, escolhi sentir, mesmo sabendo que nunca darei conta
de tudo e que nem sempre as coisas farão sentido. Me devolvi às
letras... Os versos me organizaram, ouvi meus ecos sedentos e minha
mudança de posição me
deu movimento. Quem eu sou será uma constante, quem eu serei, nunca
saberei, mas quero
estar comigo. E que o outro seja bem vindo posto que nem que eu tenha
todos os sentimentos do planeta,
poderei amar sozinha. E, mesmo que haja
intencionalidade, que sejam bem vindos os desinteressados. Me absolvo
das amarras, dos castigos, das idolatrias. No meu baú guardo as
re-edições da minha história, guardo as saudades que não pesam, guardo a
gratidão de ter vivido. Sigo Atravessando tentando não ser trave, pois
a Travessia é o que sou...
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