Postado por Milene Lima
“O que tu tá fazendo aí nesse nome?”, perguntou-lhe o amigo
surpreendido com o seu chamado na janela.
“Eu agora só tenho esse nome”, respondeu, num quê de mentira mal
contada, a qual ela própria desacreditava.
Gostava de fugir. Se não lhe
eram possíveis as fugas mais audaciosas, praticava as que lhe dessem algum retorno
imediato... Um refresco na quentura insuportável que haviam se tornado aqueles
dias. Pediu a chuva. Fez arremedos de versos para ela, mas isso foi de pouca
valia. Não que não houvesse aparecido a chuva. Os dissabores é que estavam
encardidos demais para serem clareados na ligeireza de água que o céu derramou.
Seguiam ali, os dissabores encardidos, feito sombra aonde quer que seus passos caminhem.
“Tudo culpa desse mês de abril”, resmungava para os seus próprios botões
cansados de tanta queixa. O mês em questão, segundo a sua percepção desatinada,
parecia ter trazido os seus trinta dias desprovidos de boa vontade. Passavam
rabugentos e ela, numa súplica silenciosa, pedia que se aviassem.
Tola. Um nome é apenas um nome. Fosse abril ou janeiro, tivesse ela um
ou dez nomes, os desassossegos não trocariam de roupa apenas por sua vontade. De
nada adiantaria cortar caminho por atalhos supostamente facilitadores; era
preciso viver, um a um, todos os dias que passavam sem o menor senso de
humor e até lhes oferecer um riso amarelo, deixando cair a faca entre os
dentes.
Estava agora naquele nome, na outra janela, mas era a mesma indisfarçável
alma. Era o velho coração, o que adorava se aventurar em caminhos pouco seguros
e, exausto, se percebia a esmo sem saber direito como voltar pra casa. Eram os
pensamentos de outrora insistindo passos perigosos entre o racional e o
absurdamente emocional daquela linha sutil. Eram os fiapos de sensibilidade,
danosos ou benignos, a se misturarem num emaranhado de lucidez insana, lhe
mantendo viva.
Ao amanhecer, fitará o espelho em busca de respostas que certamente
não virão. Chuvas adoradoras de poesia, dissabores encardidos e teimosos, rotas
de fugas inúteis... Um nome é só um nome. O fitar-se no espelho de dentro é o
que define como serão os passos nos fragmentos de tempo de cada amanhecer.
Ela sabe. Ela sabe?