terça-feira, 29 de julho de 2008

As minhas saudades....


João Almeida

Eu não troco minhas saudades por nada! Por este “agora”, por hoje nem pelo futuro!

Não troco a minha infância na roça, pela infância nos parques... As fruteiras pelos Fast food.

Não trocaria os trens (todos foram extintos) por metrôs do futuro. (ainda em construção em Salvador) Nem a Maria Fumaça eu trocaria.

Não trocaria meus professores com quadro-negro, pelos leves toques em teclas de controles e teclados.

Não trocaria o corredor da rua Chile pelos espaços de nenhum shoping. Não trocaria as vitrines do Adamastor, da casas Slloper, da Washi e etc , etc, etc.... Nem a Av. Sete, muito menos a Baixa dos Sapateiros também não trocaria.

Não trocaria o Cine Guarani, Tamoio, Exelsior, Liceu e o Cine Tupy por nenhum Multiplex.

Não trocaria as cadeiras de madeira do cine PAX nem do Jandaia onde assistir dois filmes de Cawboy custava pouco...

Não trocaria a Dama de Roxo, por nenhuma maluca solta por aí, quase em cada esquina.

Não trocaria o time do meu BAHIA de 59 pela seleção alemã, francesa nem italiana. Por esta seleção brasileira de hoje ?, mas de jeito nenhum... A minha saudade sabe o que está dizendo...

A minha saudade não troca a Fonte Nova só com o anel inferior por nenhum estádio do mundo. Quando não tinha dinheiro arranjava um lugarzinho no morrinho lá no Jardim Baiano de onde dava pra ver um bom pedaço do gramado. Naquela Fonte Nova, vibrei, chorei e até sofri. Assisti várias Olimpíadas Baiana da Primavera e que a minha saudade não trocaria nem pelas olimpíadas mundiais, espetaculares e com atletas que da gosto de vê na tv, superação de marcas a cada ano. Mas e os atletas da minha saudade? Simples, alunos jovens, uma geração com um perfil de quem infelizmente não ficou cópia .

Pela minha saudade da Praça da Sé, dos botecos das transversais estreitas, ligação com a Saldanha da Gama, eu não trocaria por nenhuma praça incravada nos shopings, espaços que se multiplicam muito bem organizados mas onde não se vê o lado humano. Se você não levar ou não tropeçar por acaso em algun conhecido, vai sentir falta das piadas de Ariovaldo, da voz afinada de Benigno, e das meninas exalando um perfume adocicado com sorrisos maliciosos .

A minha saudade debruçada diante da Bahia de Todos os Santos se fortalece com o mesmo mar, se o olhar for rasteiro, roçando as águas, ele está lá. Para o lado da Contorno existe uma obstrução que a minha saudade não gostaria que estivesse ali.

Não trocaria a minha saudade por nada...Não! não trocaria até a do nosso amor na juventude, Maria!

Só na Ribeira me senti como se ali estivesse aqueles tempos, tempos que ainda não precisava sentir saudades! Tudo lá é muito parecido com a Peníssula de antigamente.

Tudo muito novo, moderno, avançado... Mas como me dá saudade de tempos passados.... Nada tem a mesma cor, o mesmo cheiro, o mesmo sabor...

sábado, 26 de julho de 2008

CANÇÃO DE OUTONO


Cecília Meireles


Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.


Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...




Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.


Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...

Cecília Meireles

quarta-feira, 9 de julho de 2008

VIRANDO PÁGINAS

João Almeida


1949, 25 de maio,

terça feira, madrugada.

Lá vem eu!

Olha lá eu!

numa casa grande de corredor,

com quintal plantado,

e o rio Subauma

correndo lá no fundo.



Lá vem eu!

engatinhando pelos degraus,

pegando o corredor

até me pendurar

na grade da porta da frente.



O tempo passa,

e olha lá eu,

já do outro lado da porta

na sombra do tamarineiro.



O tempo passando,

e lá vai eu

subindo a rampa,

brincando na feira

e pulando vou descendo

pra rua de baixo.



Vejam! olha lá eu

mergulhando no pocinho...

---Menino! Tu vai pegar um resfriado!

Me enxugo no sol

e subo o morro dos araçás .



Agora já rapaz, olhem eu

atravessando a pinguela,

encontro incerto, ninguém por perto...



Lá vem eu!

Pegando o trem .

Daqui dá pra ver

minha felicidade

não veio na bagagem.



Olha lá eu!

desembarcando assustado,

seguindo para uma casa vazia,

morada dos outros, minha morada.



Olhem lá eu

expulso da morada dos outros

sem saber pra onde ir

com vontade de pegar o trem de volta.



Olhem eu ficando,

trabalhando, labutando,

encontrando o dia

depois de noites perdidas.



Olha lá eu!

Doente, julgado imprestável,

afastado...



Mas, olha lá eu!

recuperado, reintegrado.



Olha eu poeta!

pérolas e baboseiras

num círculo de sentimentos

arrancados pela sinceridade.

poemas perdidos, esquecidos

na verdade mortos...



Lá vem eu!

chorando, chorando, chorando...

Mas olha lá eu!

sorrindo, sorrindo, sorrindo.



Olhem! sou eu mesmo!

bêbado incompetente,

sem atitude, incoerente,

ficando diante de barcos que partem,

caminhando pelas praias desertas

e deserto.



Vejam! Olha lá eu!

engolindo sem vontade,

sóbrio numa roda alcoolizada.



Lá vem eu!

escorregando esperança abaixo,

julgado culpado sem culpa,

culpado absolvido.



Olha lá eu!

sem saber o que dizer,

falando pra valer palavras perdidas

e calado encontrando palavras

que nunca serão ditas.




Observem eu encontrando o sol!

escondido por trás de pesadelos

dos passos apressados da vida..



Olhem! Olha lá eu!

Se vocês prestarem bem atenção

Vão me ver sufocado

num espaço sem saída,

enquanto o tempo

muda a cor da vida

descolorindo o que deixei de viver.



Olha lá eu!

capengando de dor,

gemidos que não chegam

a nenhum ouvido.



Mas olha lá eu!

andando firme, corajoso,

olhem eu chegando,

olhem eu chegando!

chegando, chegando,

olhem eu aqui...



Salvador , 26/02/96.